A Revolta da Vacina
“Tudo volta ao que era, só que diferente.” Estes são dizeres de Hegel que aprendi em meu primeiro dia do curso de mestrado em filosofia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro que nunca abandonaram meu pensamento.
Há 114 anos durante o governo de Rodrigues Alves acontecia em nosso país a chamada “Revolta da Vacina”. Na época o sanitarista Oswaldo Cruz enviou ao Congresso Nacional um projeto que tornava obrigatória a vacinação visando erradicar uma doença que provocava epidemias maléficas. Esse projeto foi aprovado pelo Congresso em 31 de outubro de 1904 como “Lei da Vacina Obrigatória”.
Nele eram exigidos comprovantes de vacinação para a realização de matrículas nas escolas, assim como para obtenção de empregos, viagens, hospedagens e casamentos. Previa-se também o pagamento de multas para quem resistisse à vacinação. Mas apesar das óbvias e boas intenções em relação à saúde populacional, o projeto foi entendido como arbitrário e despótico, sendo suas medidas apontadas como violação dos direitos civis e constitucionais.
Esse projeto não era apenas relativo à conscientização da população, mas desencadeava medidas forçadas chegando ao ponto de invasão de residências para aplicação da vacina. Em 5 de novembro a oposição criou a “Liga contra a Vacina Obrigatória”
Foi intensa a revolta popular com movimentos diversos chegando a depredações o que fez o Governo Federal declarar Estado de Sítio no dia 16 de novembro. A retomada das ações de vacinação do Governo, em pouco tempo, levou à erradicação da varíola.
Estamos vendo hoje nas redes sociais uma crescente resistência aos movimentos de vacinação. Isto se deve, sem dúvida, principalmente ao desconhecimento de nossa história sanitária. Está havendo uma minimização dos efeitos maléficos da propagação da doença. Posições pessoais estão desconsiderando o malefício social que podem gerar uma vez que a propagação da doença costuma se iniciar com pequenos focos disseminando o seu alastramento.
Não somos cidadãos isolados, somos parte e pertencemos a uma sociedade múltipla e temos imensas responsabilidades em relação a ela, a todos os nossos companheiros de vida. Por algumas de nossas atitudes podemos fazer um grande mal, não só a nós mesmos como aos que nos rodeiam. E este foi o motivo pelo qual o eminente cientista Oswaldo Cruz lutou e conseguiu implantar a obrigatoriedade da vacina. Ele não pensava em indivíduos isolados, ele levava em conta a sociedade como um todo.
É sempre bom relembrarmos um magnífico pensamento do renomado filósofo e ativista político que foi Ortega y Gassett e que resume o pensamente eminentemente social: “Yo soy yo y mi circunstancia, “si no la salvo a ella, no me salvo yo”.
*Luiz Roberto Londres é presidente do Instituto de Medicina e Cidadania (IMC).
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